terça-feira, 6 de setembro de 2011

parte treze



Quando tudo era sozinho. e eu não era mais que um cobertor putrefacto, abandonado num qualquer canto do mundo, à espera que numa rajada de vento, tudo ficasse com vista imaculada sobre mim. os tempos em que a esperança reinava que esse dia pudesse chegar, vão mais distantes do que a minha memória se consegue exactamente lembrar. no entanto há alturas que uso minha mente para navegar no passado, enquanto olho para todos estes esquimós, ocupados em viver as suas vidas, como se fosse possível andar de fato cinzento e gravata aqui em cima.

a verdade é que o passado agride toda a gente, porque permite viajar em pedaços sensoriais tanto belos e prazeirosos, como frios, pantanosos absolutamente indignos de vida humana. e todos nós temos lama. todos temos esterco no qual por vezes chafurdamos, para chegar à verdade que queremos obter. que até pode ser mentira.

sim, nós somos de tal forma estranhos, que nunca nos pusemos realmente a pensar sobre se as outras espécies não nos olham com desdém, desprezo e até jocosidade. podemos ser as armas de gargalhada das formigas ou das minhocas. os pássaros podem atirar merda para o nosso mundo enquanto voam, simplesmente porque apostaram com um pássaro amigo, que eram capazes de acertar na cabeça de um tipo qualquer.


todas as espécies têm particularidades,umas de excelência e honradez, outras de negritude e cinismo. e enquanto tudo vive consoante os seus esquemas, todos têm medo de ser coisas diferentes. a mudança não nos está tão subentendida quanto tanta gente quer fazer parecer.

é curioso pensar nisto enquanto olho para a lareira e como uma maçã, cujo sabor se mantém inalterável ao longo dos tempos. e enquanto mantenho o meu cobertor sujo e podre a cobrir-me, como se fosse a primeira vez que o estivesse a experimentar.

sim o homem faz-se de hábitos. eu fiz-me de medos que não consigo largar.

trilho sonoro: blind melon - change